Manuel de Oliveira Guerra - "Caminho longo"

Na rubrica mensal, Autores Espinhenses, pretendemos dar a conhecer autores que nasceram, viveram ou ainda vivem em Espinho e que contribuíram para o desenvolvimento literário e cultural do concelho.  A seleção referente ao mês de dezembro incide sobre a obra de Manuel de Oliveira Guerra. 
"Manuel de Oliveira Guerra, poeta e contista, nasceu em Oliveira de Azeméis, em 1905. Filho de um operário vidreiro da Marinha Grande que virou industrial do seu ramo em Oliveira de Azeméis. Manuel acompanhou de perto a luta do seu pai e conhecia como ninguém os meandros da fábrica. Com onze anos, é atacado pelo "mall de Pott”, grave doença óssea, que o levou a afastar-se da sua família e da fábrica, para ser internado no Sanatório Marítimo do Norte, em Francelos. Ali esteve onze anos da sua vida que marcaram para sempre a sua existência. Um rapaz habituado à agitação viu-se amarrado a uma cama. Apesar desta circunstância e graças às lições que recebeu de um professor que visitava o sanatório, Oliveira Guerra concluiu o 2.º ano no Liceu de Aveiro. Mas desde tenra idade que as leituras e a escrita o levaram a querer obter mais conhecimento. Os seus primeiros passos na arte literária, no género poesia, foram publicados no jornal O Correio de Azeméis (1922) e criou um pequeno jornal do Sanatório, O Girassol, de que foi director entre 1924 e 1928 e, muito mais tarde, numa espécie de romagem de saudade, entre 1955 e 1956. Foi também nesse período de internamento que, por ao Sanatório chegarem com regularidade jornais da Galiza, se apaixonou pelos problemas da cultura luso-galaica, nomeadamente pelas relações entre Portugal e a Galiza. Tendo saído do Sanatório em 1928, regressou à fábrica paterna, não deixando, porém, de continuar a escrever, sobretudo poesia. Em 1932, por sugestão de um amigo, escreveu em pouco mais de um mês a colectânea de poemas Padre... Nosso, que Silva Pinto editou com prefácio de Ramada Curto e se esgotaria em duas semanas. Problemas de ordem religiosa, política e, sobretudo, familiares, então surgidos, impediram a segunda edição que Silva Pinto exigia, como exigia a publicação do segundo livro de poemas já pronto, Ave Maria, e do livro de contos em preparação, Os Trinta Dinheiros. Passados alguns anos e após ter constituído família, Oliveira Guerra viajou sozinho pelo Brasil, regressando em 1939 a tempo de verificar que tudo que deixara se esboroara. Assim, em 1941, foi forçado a estabelecer-se como comerciante no Porto, actividade que, sem vocação e por meras razões de subsistência, manteve até morrer. Entretanto, em 1960, volta às suas duas paixões: a literatura e a Galiza. Reedita o seu primeiro livro e começa a edição dos inéditos, ao mesmo tempo que cria a revista de aproximação luso-galaica Céltica, de que foram publicados quatro tomos, colaborados por intelectuais do Norte português e da Galiza, onde a iniciativa foi entusiasticamente recebida. Em 1961, tentou a criação do Círculo de Estudos Galaico-Portugueses, inicialmente apoiado pelos intelectuais e artistas da Galiza e pela Associação de Jornalistas e Homem de Letras do Porto. A iniciativa, posto que se tenha gorado por obvias razões políticas, era pioneiro e criou oportunidades múltiplas de discussão do problema das relações culturais entre dois países. Países onde presentemente se regressa ao interesse pela obra de Oliveira Guerra, cuja prosa «surpreende pela singeleza dos diálogos, pela naturalidade com que flui a narrativa», «a mesma singeleza, [que] aliás [lhe] povoa a poesia» (Salvato Trigo), como se revisitam os seus «caminhos de um diálogo luso-galaico, parte integrante do diálogo ibérico que Torga, também ele presente na escrita do autor de Padre... Nosso, nos aconselha a percorrer», (Idem).” Oliveira Guerra deixou um valioso espólio de inéditos, à guarda de uma das suas quatro filhas, Virgínia Monteiro, atualmente conhecida como Virgínia Guerra, também ela escritora, que não teve tempo de editar como era seu intento, uma parte do qual, no entanto, se terá perdido.” 
"Foi em 1962, muito perto do final da sua vida, que Manuel de Oliveira Guerra publica em edições de autor um livro de contos, "Caminho Longo” que se caracteriza pela simplicidade dos diálogos, pela naturalidade com que estes fluem, pela forma agradável e tradicional com que a história foi criada. 
A este seguiram-se dois poemários: «Coisas desta negra Vida» e «Algemas». Aqui estão presentes todas as frustrações e revoltas sentidas pelo escritor, contra tudo o que foi obrigado a pagar pelos erros que cometeu na sua juventude. O desprezo sobre um quotidiano estreito para as suas ambições intelectuais, onde não possuía dinheiro nem tempo para se dedicar ao que mais gostava de fazer: escrever. 
Tal como se caracterizou a sua vida, a morte de Manuel de Oliveira Guerra também se pautou pela simplicidade. Cansado e desgastado pelas agruras da vida, morreu a dar uma bolacha à filha da empregada. 
Como sempre fez na sua vida, Manuel de Oliveira Guerra partiu deste mundo a dar e nunca a receber. E tal como a simplicidade que o acompanhava a sim foi o cortejo para a sua última morada. Num cemitério situado em Espinho, repousa numa capela modesta junto ao mar. Um cenário tão simples como foi o filme da sua vida.” 

Referências bibliográficas 

GUERRA, Manuel Oliveira, 1905-1964 ; TRIGO, Salvato ; LISTOPAD, Jorge, 1921-2017 - Caminho longo. Porto : Papiro, 2006. 278, [5] p. ISBN 989-8056-23-1 
Manuel de Oliveira Guerra: amado em Espanha, esquecido por Portugal. [Em linha]. [Consult. em: 23 de abril de 2022]. Disponível em https://mundodelivros.com/manuel-de-oliveira-guerra/